Serafim Tibúrcio da Costa. Ao lado, reprodução do dinheiro da época da República, o Boró |
Ainda na esteira das comemorações do 117º aniversário da ‘República Manhuassú’, que se estende entre os dias 10 de maio a 3 de junho, período este que, em 1896, o Coronel Serafim Tibúrcio iniciou o movimento revolucionário no município, este espaço promove aqui mais alguns fatos relacionados a este momento da história de nossa cidade. Porém, serão traçados nas próximas linhas alguns poucos exemplos que dão os devidos créditos para se afirmar que realmente a população vivenciou um longo período de silêncio sobre os fatos que ocorreram aqui no apagar das luzes do século XIX.
E para embasar este texto, buscou-se no livro ‘A República do Silêncio’ do professor Flávio Mateus dos Santos, alguns dados para ilustrar estas linhas. Mais precisamente ao assunto abordado pelo autor desta obra no Capítulo 3 entre as páginas 206 e 225, sendo talvez o ponto crucial deste livro, pois nas referidas páginas encontra-se a justificativa para o título desta importante obra.
É sabido que os políticos ligados aos dolabelistas se mantiveram no poder nas décadas seguintes ao movimento proposto por Serafim Tibúrcio. Isso é provado pelos nomes das ruas que cortam o perímetro urbano da cidade, comprovando também, como um grupo político se sobrepõe a outro.
Interessante também é saber que esta facção contrária à ‘República Manhuassú’ denominada dolabelista, permaneceu no poder sem a condução de seus dois expoentes: o vigário Odorico e seu irmão Frederico Dolabela. Estes dois, talvez descontentes e com algum sentimento de culpa pelos rumos políticos que resultaram naquele movimento revolucionário, abandonaram as esferas políticas e o município poucos anos depois, quando os sentimentos belicistas deixaram de aflorar. Após o período em que administraram o município, os dois irmãos não mais se envolveram nas questões políticas.
Para se saber qual dos dois grupos políticos (serafinistas e dolabelistas) foram mais homenageados ao longo do século XX, basta folhear as páginas amarelas do catálogo de telefone para concluir que o segundo grupo reinou absoluto em Manhuaçu. Poderá se perceber que os inimigos de Serafim Tibúrcio e de seus descendentes possuem mais nomes de ruas, sendo estas vias também as mais importantes da cidade. Temos como exemplo primeiro, a avenida Antônio Welerson, principal acesso ao Centro de Manhuaçu. Este homem que teve seu nome cedido para denominar esta avenida, foi o promotor público expulso por Serafim Tibúrcio no período do levante revolucionário.
Temos a rua Alceste Nogueira da Gama, um descendente direto do dolabelista Coronel Leopoldo Nogueira da Gama e a rua Frederico Dolabela. As duas também na área central da cidade.
Já a rua Coronel Serafim Tibúrcio está localizada no alto do bairro Coqueiro, em um ponto que até recentemente era isolado do Centro, em um local que não permitia à população recordar sempre de seu nome. Somente nos tempos atuais esta região tem percebido um grande desenvolvimento, movido pela expansão na área da educação que tem se concentrado ali. E um fato curioso apontado no livro do professor Flávio Mateus dos Santos sobre a denominação desta rua, é que ela foi nomeada pelo então presidente da Câmara Municipal de Manhuaçu Antônio Welerson, no dia 3 de agosto de 1914. No livro ‘A República do Silêncio’ fica uma pergunta: por que um inimigo seria homenageado com o nome de uma rua? Talvez esta pergunta possa ser respondida com outra pergunta: por que a homenagem aconteceu em uma rua localizada no alto de um morro e não na região central da cidade? Afinal, nos registros oficiais de Manhuaçu, Serafim Tibúrcio aparece como o primeiro agente executivo (prefeito) eleito neste município.
Pode-se perceber que, mesmo sutilmente, o grupo político que recebeu o município para administrar ao longo das décadas seguintes, procurou apagar da memória da população os nomes dos serafinistas.
O dolabelista Alceste Nogueira da Gama, que foi homenageado cedendo seu nome a uma rua foi o homem que Antônio Welerson enviou para buscar apoio das forças federais para enfrentar o Coronel Serafim Tibúrcio. Alceste foi juiz de paz do município de Manhuaçu e exerceu a função de subchefe do Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP) durante o governo Getúlio Vargas. Este talvez tenha sido o principal órgão do governo ditatorial, já que naquele período eram divulgadas somente as notícias que interessavam à ditadura e aos seus aliados, se propondo ao papel até mesmo de polícia para defender as ideias do Estado Novo. A capacidade deste órgão de centralizar as ações, informações, as ingerências no âmago da sociedade e o poder de censurar a vida cultural brasileira daquele período lhe dotaram de uma autoridade sem igual.
Este importante cargo dado a um dolabelista naturalmente serviria como uma forma sutil de pressão para intimidar quem estivesse disposto a escrever a história do movimento serafinista, já que abordar o movimento ‘República Manhuassú’ poderia trazer à tona antigas rivalidades que comprometeriam nomes de pessoas muito importantes para o cenário político de Manhuaçu, conforme abordado no livro do professor Flávio Mateus.
No entanto, a denominação dos nomes destas ruas aos dolabelistas, fazendo alusão neste texto que isso tenha acontecido como forma de apagar o outro grupo da história de Manhuaçu, não diminui o mérito para que estas pessoas tenham recebido tais homenagens. Estas são personalidades conceituadas que deixaram seu legado para o progresso de nosso município e que merecerão sempre este reconhecimento. A intensão é, tão somente, ilustrar o texto que explica o ‘Silêncio’ que dá título ao livro, mantendo a linha de raciocínio abordada nesta obra.
O texto deste domingo para a coluna ‘Na Lente da História’ foi totalmente baseado no trecho supracitado da obra ‘A República do Silêncio’, de Flavio Mateus dos Santos, que conferiu ao jornal DIÁRIO DE MANHUAÇU a liberdade para reproduzir suas linhas e ideias.
Publicado em 26 de maio de 2013.