A ‘República Manhuassú’ revista por outra ótica – Parte IV

Major Antônio Frederico Dolabella,
um dos líderes do grupo oposicionista ao grupo de
coronel Serafim Tibúrcio da Costa

Damos aqui prosseguimento à elucidação dos fatos turbulentos que aconteceram em Manhuaçu no período que corresponde entre os anos de 1890 e 1896, que culminaram no movimento revolucionário conhecido com ‘República Manhuassú’. Este movimento, considerado por muitos como um fato heroico que proporcionou por algumas semanas ao imenso município de Manhuaçu, o status de país dentro dos limites de Minas Gerais, teve também seus questionamentos, que colocam à prova a veracidade de muitas ações que aconteceram durante o levante do Cel. Serafim Tibúrcio da Costa. Ou, no mínimo, deixam dúvidas sobre as reais intenções dos homens comandados por Tibúrcio.
Como todo movimento belicista, em que um lado procura sobrepujar o outro através da força, provocando assim defesas veementes das ideias entre os oponentes, a história que vem sendo contada durante os últimos anos, está recheada de contradições, principalmente se levar-se em consideração as informações colhidas por pessoas descendentes do grupo antagônico ao do coronel revoltoso. As próximas linhas, contam através de documentos e causos, um levante ocorrido em uma determinada região do perímetro urbano da jovem cidade e que, para muitos, foi um teste de Tibúrcio para comprovar a fidelidade da população de baixa renda com os seus ideais de retomar o poder no local.

REVOLTA DO COQUEIRO
O coronel Tibúrcio não ficou conformado com a forma como perdeu as eleições naquele ano de 1894. Ele entendia que o vigário Odorico Antônio Dolabella e seu grupo intitulado ‘Dolabelista’ haviam conquistado as eleições de forma fraudulenta. Mas naqueles primeiros momentos que se seguiram à sua saída do cargo de presidente da Câmara e Agente do Executivo, Tibúrcio preferiu evitar o confronto com o grupo que o derrotou nas urnas.
Para os seus oponentes, o coronel era conhecido por sua sagacidade e esperteza. E isso lhe conferiu a intenção de agir somente à surdina, para trilhar os caminhos que o levariam ao poder municipal novamente.
Deste modo fez crer a todos que havia se mudado para Caratinga e que iria abandonar em definitivo a vida política. Mas sem o conhecimento de muitos, ele mantinha conferências com dois de seus aliados, que davam conta dos acontecimentos em Manhuaçu. Eram eles, Lino Justino Pinto, conhecido no lugar como Lino Lopes e Antônio Cecílio de Miranda. Para manter estes homens como seus aliados, Tibúrcio oferecia vultosa soma de dinheiro. 
O coronel confiava aos dois homens a missão de persuadir todos os habitantes do Ribeirão do Coqueiro, contra os líderes ‘Dolabelistas’, sendo: os irmãos Major Antônio Frederico Dolabella e o vigário Odorico Antônio Dolabella, José Martins de Oliveira, Major Leopoldo Nogueira da Gama, Dr. Alberto Diniz, Dr. Agripino Castelo Branco e Diogo Menezes. Eles incitavam a população daquele local contra este grupo, argumentando que os ‘Dolabelistas’ iriam expulsá-los de suas terras. O pretexto utilizado pelos ‘Serafinistas’ provocavam o temor, porque naquela época o major Frederico Dolabella e José Martins de Oliveira já eram donos de grande quantidade de terras nas imediações. Havia então entre aqueles, que suas terras, adquiridas com tanto sacrifício, estaria ameaçada.
Deste modo eles aceitaram os argumentos impostos pelos homens de Tibúrcio e decidiram enfrentar todo tipo de risco. Eles entendiam que a situação apenas seria resolvida com o retorno de Serafim Tibúrcio para a presidência da Câmara. Para isso, o plano era invadir o Cartório de Registros e destruir o processo que era movido contra Tibúrcio, pelo homicídio de Joaquim Geraldo, que já havia sido usado contra o coronel durante as últimas eleições.
Juntou-se aos ‘Coqueiristas’ outros membros da população, que já se encontravam revoltosos com o aumento demasiado dos impostos municipais. Deste modo, aconteceu a tentativa da citada revolta na madrugada de 10 de fevereiro de 1895, pouco mais de um ano antes da declaração da ‘República Manhuassú’.
A cadeia local contava apenas com três praças, que foram facilmente dominados pelos ‘Coqueirista’. Outra parte da população, alarmada com aqueles acontecimentos, partiram para o local, munidos de suas armas, dando início a extenso tiroteio. No meio da confusão, um aliado dos ‘Coqueiristas foi ferido mortalmente por seus próprios companheiros, que o confundiram com um soldado. Isso desmotivou os revoltosos, que decidiram por fim ao plano engendrado por Tibúrcio.
Após o ocorrido, foi instaurado um processo no dia oito de julho daquele mesmo ano contra o líder do movimento, Cel. Serafim Tibúrcio da Costa e seus cúmplices, por crime de sedição, homicídio, tentativa de homicídio e danos materiais em repartição pública.
Tibúrcio não compareceu às audiências, tendo nomeado para representá-lo, seu procurador e advogado, José Coelho Gomes, que também ficou encarregado de sua defesa.
Do libelo de 12 parágrafos, são extraídos os dois primeiros e o último:
1§ “Que os réus na madrugada de dia 10 de fevereiro do corrente ano, vieram a mando do Sr. Cel. Serafim Tibúrcio da Costa, a esta cidade, com o fim de assalta-la e matar os Drs. Agripino Castelo Branco e Francisco de Souza Mello Netto, Alberto Diniz, Diogo de Menezes e vigário Odorico Dolabella, Frederico Dolabella, Leopoldo Nogueira da Gama e José Martins de Oliveira;
2§ Que os réus premeditavam, depois de mortos os acima referidos, saquearem a cidade e incendiarem os arquivos dos cartórios, os da Câmara Municipal, para deste modo desaparecerem os autos crimes contra o Cel. Serafim Tibúrcio da Costa e outros. E os documentos referentes às terras do Coqueiro, e os que provam o alcance do dito Cel. Serafim Tibúrcio na passada Administração Municipal;
12§ Que o crime foi cometido em repartição pública. Nestes termos pede-se a condenação dos réus nas penas do grau máximo”...

As informações que auxiliaram na composição destas linhas foram baseadas em um vasto trabalho de pesquisas nos arquivos da Fundação Manhuaçuense de Cultura, Câmara Municipal de Manhuaçu, Cartório do Crime e da cidade de Afonso Cláudio (ES), realizados por ocasião das comemorações do Centenário de Manhuaçu no ano de 1977, por equipes de estudantes da então Escola Normal e Colégio Tiradentes, sendo orientados pelo Sr. Ary Nogueira da Gama e que foram gentilmente cedidos por ele à coluna Na Lente da História.


Publicado em 09 de agosto de 2013.